CAPÍTULO ONZE
Tradução e revisão por Carmen M. Souza no Praticamente Única
Resolvi deixar de lutar colocando toda a tradução em verbo presente. Tipo, que idiota, colocar quase 60 episódios em outro tempo verbal em vez de mudar os quatro primeiros 🥴 Típico de eu. Enfim, parece que o drama tá chegando aí, então estou tirando tempo do meu trabalho pra tentar terminar a tradução da novel logo hehe Orem. Boa leitura!
“Song Yan, vamos voltar a ficar juntos.”
Xu Qin acordou no meio da noite com as palavras de sua versão sonhadora.
A versão consciente dela estava momentaneamente perturbada pelas palavras que ela deixou escapar. Se ele tivesse concordado, o que aconteceria depois?
Ela ousaria contar para os pais? Não.
Eles poderiam ficar juntos por um longo tempo? Provavelmente não.
Ela sabia que era impossível, mas naquele dia, ela era como uma pessoa louca se afogando, que só queria agarrar seu pedaço de madeira flutuante para salvá-la de sua vida apática.
Se resgatada, ela poderia realmente abandonar sua dita vida anterior e romper todos os laços com sua família?
Xu Qin sabia a resposta muito claramente. Então, quando ele a rejeitou, além da dor e do desespero, havia uma sensação de segurança e felicidade por não precisar ajustar sua situação atual.
Ela sempre esteve dividida entre essas visões conflitantes, ela nunca foi resoluta.
A noite está silenciosa, ela pensou, ela devia estar tão feia naquele dia. Song Yan devia ter claramente visto seu eu feio sob a máscara, por isso se enojou dela e a desprezou; por isso ele não estava disposto a fazer as pazes com ela, e nem sequer olhou para trás.
Às três horas da manhã, ela se sentou cama com calafrios ao longo dos braços. As janelas estavam abertas e o vento da noite estava muito frio.
O clima no norte sempre esfriava inesperada e rapidamente, sem qualquer aviso.
O outono já estava aqui. Caso contrário, como a noite poderia estar tão fria?
Xu Qin é, na verdade, nativa do sul. Antes dos dez anos, ela cresceu na região fértil da cidade de Liang.
Desde jovem, ela teve uma aparência delicada e bonita, com um cabelo fino, macio e flexível com uma cor natural de linho, assemelhando-se a uma estrangeira exótica. Nos dias em que tintas de cabelo estava se popularizando, era isso que seus colegas de classe invejavam. Ainda mais invejável era sua identidade – a filha do prefeito, o quão assertivo isso soava; a filha de uma escultora bem conhecida, quão romântico isso soava.
Ela morava em uma grande vila desde que era pequena, ouvia sinfonias e olhava para famosas pinturas renascentistas; estudava piano e violino e viajava por todo o mundo – era a orgulhosa filha dos Céus. Um dia, sua boa vida de repente começou a se separar por dentro.
Mamãe e papai não estavam mais apaixonados, brigavam dia e noite. Mamãe gritava: “Mentiroso! Mentiroso! Vou denunciá-lo!” Papai rosnava cruelmente: “Se não podemos continuar, basta nos divorciar, o que exatamente você quer fazer?”
Xu Qin não sabia sobre o que seu pai havia mentido para sua mãe, e ela não sabia exatamente o que sua mãe queria. Ela não conseguia entender nenhuma dessas questões. Sua mãe ateou fogo naquela casa feliz tarde da noite, matando queimados ela mesma e seu marido uma vez amado. Talvez ela também quisesse queimar o fruto de seu amor – Xu Qin.
Mas Xu Qin foi resgatada e enviada para o orfanato. A fofoca correu desenfreada na escola da cidade, as expressões das pessoas ao seu redor se tornaram diferentes, zombando dela com diversão.
Os funcionários da creche e as crianças do orfanato não gostavam dela e falavam de seus pais pelas costas como se fosse uma piada. Às vezes, ela gritava e brigava com as pessoas, e era punida pelos funcionários a ficar de pé, trabalhar, ficar com fome e sem dormir. Seus colegas da escola também a humilhavam: “Xu Qin, por que o carro de luxo da sua família não vem mais buscá-la? Xu Qin, para onde foi sua boneca Barbie? Xu Qin, por que você não usa mais botas de pele de bezerro?” Usando a história de seus pais, eles compuseram uma música e cantavam enquanto a seguiam, puxando seu cabelo e pisando nela.
Ela se tornou cada vez mais quieta, cada vez mais como uma pessoa invisível que não existia.
Até que um dia o camarada de armas de seu pai, Meng Huaijin, e sua esposa, Fu Wenying, apareceram e disseram: “Qin Qin, estamos aqui para levá-la ara casa.”
Meng Yanchen, de doze anos, estendeu a mão para ela com um sorriso caloroso como o sol: “Qin Qin, eu sou seu irmão.”
Com a idade de dez anos, Xu Qin foi para o extremo norte.
Meng Huaijin tratou Xu Qin como sua, e a mimou. Em suas próprias palavras, ele e Xu Qin estavam destinados a ser pai e filha nesta vida. Xu Qin amava seu pai adotivo como amara eu pai biológico. A mãe adotiva Fu Wenying também cuidou muito bem de Xu Qin. Mas enquanto Xu Qin gradualmente se integrava à família, o relacionamento entre os dois irmãos chamou sua atenção.
Quando Xu Qin chegou pela primeira vez à casa dos Mengs, Meng Huaijin estava ocupado com o trabalho e raramente exercia seu controle. Por outro lado, a personalidade de Fu Wenying era arrogante e rigorosa. Ela era uma mulher que acreditava em aderir às regras, e um treinamento rigoroso era inevitável para Xu Qin, que não estava familiarizada com as regras da família. Xu Qin tremia dia e noite, temendo que Fu Wenying ficasse insatisfeita e a obrigasse a voltar para o orfanato. Ela não se atrevia a falar ou sair da sala por vontade própria, então Meng Yanchen a acompanhava e a observava esculpir madeira pelo que se tornaram incontáveis dias. Enquanto ela não se atrevia a fazer um som em casa por medo de perturbar Fu Wenying, Meng Yanchen subia e descia as escadas para abrir e fechar as portas fazendo a casa chocalhar; muitas vezes sendo repreendido por sua mãe. Ela tinha medo de escolher o que comer, medo de escolher as coisas de que gostava e medo de comer demais, temerosa que Fu Wenying pensasse que era muito caro criá-la. Quando Meng Yanchen a levava a restaurantes, ela comia até que sua barriga estivesse inchada e limpava a boca antes de voltar para casa. Ela costumava ter pesadelos sobre os gritos de seus pais sendo queimados, sonhava em ser intimidada, insultada e ridicularizada, incapaz de dormir à noite. Meng Yanchen desenhava com ela e lhe contava histórias.
Gradualmente, as crianças se tornaram adolescentes.
Embora a relação entre os dois fosse ótima, como irmãos de verdade, afinal, eles não eram realmente irmãos. Como mãe, era inevitável a preocupação de que eles cruzassem a linha. Um dia, Fu Wenying propôs passar pelos procedimentos formais de adoção e pediu a Xu Qin para mudar seu nome para Meng Qin e anotá-lo no registro doméstico.
Xu Qin não estava disposta. Ela sentou-se à mesa de jantar e enxugou as lágrimas enquanto dizia que, embora amasse o pai Meng, queria manter o nome de seu verdadeiro pai.
Meng Huaijin não podia suportar isso e sugeriu não alterá-lo, dizendo que um sobrenome era apenas um sobrenome; que mesmo que o sobrenome de Qin Qin fosse Xu, ela ainda seria sua filha por toda a vida.
Mas Fu Wenying foi muito persistente nesse assunto.
Xu Qin finalmente concordou, e foi Meng Yanchen quem a convenceu.
Um mês depois, quando ela estava no ensino médio, Xu Qin de repente propôs ir para um colégio interno. Fu Wenying concordou.
Ela mudou de colégio e foi a primeira vez que ficou em dormitórios. Suas colegas de dormitório eram todas do mesmo departamento do ensino médio da escola e se conheciam bem. Meng Huaijin temia que ela fosse intimidada, então toda a família a levou a escola juntos. Meng Yanchen também comprou um monte de lanches para as meninas do dormitório, a fim de comprar o seu favor.
No entanto, isso rendeu pouquíssimo sucesso.
Xu Qin não gostava de falar e se expressava pouco. As meninas no dormitório faziam muito barulho, então ela naturalmente sentia que não se encaixava no grupo.
Depois que os membros de sua família saíram, todas as colegas de quarto se reuniram em torno de uma garota para ver seu player da Sony em sua mão, todas perguntando se havia boas músicas na fita e para tocá-las no alto-falante.
Uma garota gentilmente chamou Xu Qin: “Meng Qin…” Ela se virou e viu o CD player vermelho-vinho na cama de Xu Qin, e exclamou: “Esse CD player não é vendido na China! Caramba, essa cor é ainda mais bonita ao vivo!”
As outras duas meninas olharam para ela: “Podemos testar?”
Xu Qin assentiu levemente.
“Ei, por que só tem música clássica?”
“Não importa, deixa tocar, vamos ser mais refinadas culturalmente.”
As três garotas vasculharam os discos animadas enquanto Xu Qin observava seus rostos felizes atentamente.
“Meng Qin, sua família é muito rica?”
Xu Qin balançou a cabeça: “É só que papai está disposto a comprar.”
“Aquele garoto alto e bonito era seu irmão?”
Xu Qin ficou em silêncio e abaixou a cabeça para organizar os CDs que elas espalharam. “Você pode me apresentar? Ele faz o meu tipo.”
Xu Qin balançou a cabeça.
“Por que não? Não seja tão mesquinha.” A outra garota insistiu.
Xu Qin levantou a cabeça e disse seriamente: “Ele não vai gostar de você.”
A garota ficou espantada, todo o dormitório olhou para ela com surpresa.
“O que você está dizendo?”
“É, você foi longe demais.”
“Só estava brincando. Não me apresente se não quiser, por que tentar me magoar?”
Xu Qin segurou a caixa com força e permaneceu em silêncio.
“Nem vai se explicar? Isso é demais!”
E assim, o que era originalmente um processo de integração suave, caiu para um ponto de frieza.
Xu Qin comeu seu primeiro jantar na nova escola sentada sozinha no refeitório.
No primeiro dia de aula, ela ainda estava sentada sozinha no canto. Os colegas de classe ao seu redor se reuniam com velhos amigos, mas ela era transferida, então naturalmente ninguém prestava atenção ao seu novo rosto.
O sobrenome do tutor da sala era Lu. Ele permitiu que todos se apresentassem e fizessem perguntas. Os jovens de quinze e dezesseis anos eram muito barulhentos, e eles também se conheciam, levando a todos os tipos de perguntas estranhas.
Como, “você acidentalmente entrou no banheiro masculino no primeiro ano?”, “você se confessou na competição esportiva do primeiro ano e levou um fora?” Todos os tipos de incidentes estranhos foram revelados. A sala explodia em gargalhadas.
Depois de um período inteiro de perturbações, o sino tocou para o término a aula, o professor Lu perguntou: “Todos se apresentaram direito, então da próxima vez vamos…”
“Velho Lu!” Uma voz masculina ressoou da fileira de trás da sala, arrogante e preguiçosa: “Essa garotinha ainda não foi apresentada.”
Referida como “garotinha”, Xu Qin virou a cabeça lentamente e olhou para trás. Na última fileira sentava-se um menino alto com um uniforme escolar folgado, um pé em uma cadeira. Ele inclinou ligeiramente a cabeça, levantou a mão direita e apontou o dedo indicador direito preguiçosamente para ela.
A risada parou por um momento. O olhar de toda a classe seguiu seu dedo indicador para se concentrar nela.
Xu Qin olhou para ele em silêncio. Ele não tinha nenhuma expressão supérflua. Seus olhos eram como os dela, olhando diretamente e sondando-a.
O professor Lu pediu mil desculpas e deixou Xu Qin subir ao palco.
Xu Qin não estava nervosa nem animada, e falou em um tom calmo: “Olá. Eu sou Meng Qin.”
Depois que ela terminou sua introdução em uma frase, não houve nenhum som dentro ou fora do palco.
O professor Lu queria encorajá-la a dizer mais algumas palavras: “Meng Qin, você tem algum passatempo? Conte a todos sobre ele.”
Xu Qin balançou a cabeça: “Não tenho.”
O professor Lu olhou para toda a classe: “Então, tempo para perguntas. Há algo que alguém queira perguntar?”
Silêncio.
O que pode ser perguntado a alguém sem informações?
Nesse momento, a voz do menino soou atrás: “Como escreve?”
Xu Qin: “M-E-N-G Q-I-N.”*
“Tão obediente, hein.” O menino que fez a pergunta levantou o canto da boca. Seu cabelo bagunçado cobria parcialmente os olhos, dentro deles estava o reflexo das lâmpadas fluorescentes da sala de aula. A luz branca era brilhante e cintilante como água.
“O irmão Yan está brincando com as meninas de novo!”
Os meninos caíram na gargalhada.
“Song Yan!” O professor Lu o repreendeu.
Alguns colegas de classe responderam: “Song Yan também não se apresentou.”
A zombaria barulhenta veio e foi, revelando que ele era um bad boy popular.
Song Yan ficou no mesmo lugar: “Todo mundo se conhece, não vou dizer mais nada. Velho Lu, a aula acabou.” Depois de falar, ele se levantou e caminhou em direção à porta da sala de aula.
Ruídos insatisfeitos surgiram.
“Eu não perguntei ainda.”
Um colega de classe que estava a uma fileira de distância de Xu Qin perguntou em voz alta: “No ano passado, Zuo Li – a que engravidou e saiu da escola – seus pais vieram para a escola e seis meninos da sua turma faltaram naquele dia. Onde você tinha ido?”
“Fui procurar sua mãe.” Song Yan disse enquanto caminhava pelo corredor. A voz rouca do jovem caiu acima da cabeça de Xu Qin.
Ele saiu da sala de aula, deixando Xu Qin com uma visão de suas costas condescendentes.
Xu Qin percebeu que ela não tinha nem um pouco de interação como Song Yan. Ela ia metodicamente para a sala, terminada a aula, voltava para seu dormitório – fazendo tudo sozinha. Ela era como uma alma solitária flutuando pelo campus.
Quanto a Song Yan, onde quer que ele fosse, ele tinha um grupo de amigos formado por homens e mulheres, todos ao seu redor. Quando ele estava lá, a sala de aula era incrivelmente barulhenta. Mas ele raramente estava – ele não ia à escola, matava aulas, fumava, entrava em brigas e sumia o dia todo.
No entanto, depois da escola naquele fim de semana, sem qualquer aviso, Song Yan bloqueou o caminho de Xu Qin e anunciou que gostava dela. Os dois ficaram de frente um para o outro por mais de uma hora, mas no final Song Yan cedeu.
Ele estava muito infeliz, pegou um cigarro, acendeu e fumou sem dizer uma palavra. Não foi até terminar de fumar que ele virou a cabeça para olhar para Xu Qin com uma expressão de “sua tola ignorante”. Mas por fim ele sorriu fracamente, levantou a mão para dar um tapinha na cabeça dela, e disse: “Vá, então.”
Xu Qin se afastou, passou por ele e o ouviu dizer: “Até a próxima semana.”
Ele a deixou ir para casa, mas não significava que ele a tinha libertado.
“Até a próxima semana, Meng Qin.” Song Yan disse.
Xu Qin não se sentiu diferente quando chegou em casa. Ela apenas explicou que se atrasou no caminho e nunca mencionou o “assédio” de Song Yan.
Mas na segunda-feira, Song Yan não foi à escola.
* Ela estava soletrando de verdade, mas o jeito chinês.
"子" e "皿" são os radicais que formam "孟", o "meng".
"水" e "心" formam "沁", o "qin".